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25 de maio de 2011
* Eduardo Biavati
Em 2004, a Organização Mundial de Saúde lançou um alerta para o crescimento de uma epidemia que transformará a saúde pública no futuro: a epidemia dos acidentes de trânsito. A ameaça já estava desenhada claramente em 1999, ocupando a nona posição dentre as dez principais causas de morte no mundo. Em 2025, esses acidentes serão a terceira maior causa de morte, superando as guerras e ultrapassando várias doenças para as quais não há hoje perspectiva de cura.
O alerta é global, mas tem destinatários certos: os homens do grupo etário de 15 a 25 anos, dos países da América Latina, do Continente Africano e de boa parte da Ásia. Assistiremos à massificação entre esses jovens da motorização sobre duas rodas e, em toda parte, a um processo de disseminação da violência no trânsito dos grandes centros urbanos para as pequenas cidades.
É o que já vem ocorrendo no Brasil desde 2006. Os maiores municípios ainda concentram 30% das mortes no trânsito no país, mas houve uma forte “migração” da violência para as outrora pacatas cidades do interior, com até 20.000 habitantes. Nelas, as mortes no trânsito cresceram a um ritmo até oito vezes maior do que nas grandes cidades.
Não há cidade no país, em qualquer região, sertão ou litoral, que tenha ficado imune à invasão das motos. Pensamos em motocicletas e logo vem à mente as imagens conturbadas de São Paulo, mas a revolução sobre duas rodas aconteceu mesmo no interior, nos pequenos centros urbanos, onde as pessoas ainda se deslocavam tranquilamente a pé ou no ritmo lento da bicicleta ou no lombo do jegue-velho-de-guerra. As pessoas simplesmente largaram o jegue no mato, aposentaram a bicicleta em prol do conforto, da velocidade e da economia inegáveis da motocicleta, e ascenderam social e economicamente sobre duas rodas na escala da mobilidade social.
A frota de motocicletas cresceu muito, mas, ainda assim, MUITO menos do que as mortes de seus pilotos e passageiros. Entre 1990 e 2006, o número de mortes de motociclistas aumentou: 2.152%.
O processo foi tão rápido que dificilmente a gestão pública do trânsito teria condições de intervir a contento. E não interviu mesmo, por uma razão simples: dos 5.500 municípios brasileiros, pouco de mais de 1.000 municipalizaram a gestão do trânsito, desde a promulgação do Código de Trânsito em 1997. O clube dos mil e poucos concentra a maior parte da população brasileira e 70% da frota nacional, muito bem, mas apenas 30% do total de mortes no trânsito.
É certo que ficaram de fora desse clube “privilegiado” praticamente todos os municípios com menos de 100 mil habitantes. Lá, onde as mortes dispararam, faltou uma autoridade pública local para lidar com o novo padrão de violência introduzido pelas motocicletas.
As motocicletas tornaram-se o vetor dessa epidemia global de violência no trânsito, mas é claro que ela não se resume às duas rodas – essa é apenas a forma contemporânea e especificamente jovem de um fenômeno que ainda mata majoritariamente os pedestres, sempre as maiores vítimas, além de ocupantes de automóveis, ônibus e caminhões.
Na última década, sob a regência do novo Código de Trânsito, o Estado Brasileiro não produziu qualquer resultado significativo de redução da mortalidade e da morbidade da violência do trânsito em nossa sociedade. Não fomos capazes de conter o avanço das estatísticas de mortos e, muito menos, a geração anual de dezenas de milhares de incapacitados físicos – amputados, lesados medulares, lesados cerebrais no simples ato de transitar.
* Eduardo Biavati é sociólogo, escritor, palestrante e consultor em prevenção de violência, juventude e promoção de saúde